quinta-feira, 8 de março de 2012

SOBRE O DESCASO PARA COM O PATRIMÔNIO HISTÓRICO, CULTURAL E ARQUEOLÓGICO EM RONDÔNIA E EM PORTO VELHO.

Tenho resistido muito a começar a escrever mais solidamente sobre o tema do descaso e falta de cuidados com o nosso patrim...ônio histórico, cultural e arqueológico em Rondônia em geral e em Porto Velho, cidade onde resido, em específico. Assumo o erro. Mas antes tarde do que nunca, após o penitenciamento é hora de arregaçar a manga e partir para o trabalho.
Nesses tempos de tantas transformações em nosso estado de RO e em sua capital, Porto Velho, fico estarrecido diante da enormidade do descaso para com o patrimônio histórico, cultural e arqueológico que possuímos e que está sendo sistematicamente destruído sob o olhar indiferente ou mesmo conivente dos poderes estabelecidos para preservá-los e protegê-los. Pior, a sociedade pouco tem se manifestado. Assistimos há poucos dias a destruição do antigo Marco divisório dos estados do Mato Grosso e Amazonas, situado logo abaixo da cachoeira de Santo Antônio, levado pelo banzeiro provocado pela abertura de uma das turbinas da Hidrelétrica. Alardearam que o mesmo foi resgatado. Sim, aos pedaços, destruído. Será que irão RESTAURÁ-LO ou apenas o maquiarão e farão remendos para o recolocar no lugar? Ou quem sabe, nem isso, uma vez que as vozes sociais pouco têm clamado nesse sentido. Vimos nesses dias que a ponte da EFMM que corta o rio Jacy está submersa e que os autoridades das UHEs do rio Madeira informaram que a mesma ponte ficará, doravante submersa, em média por 3 meses por ano, tendo uma autoridade patrimonial informado que tal situação não implicará em danos à ponte que é de ferro.
Agora temos a notícia de que as águas do reservatório de Santo Antônio estão chegando à igreja do mesmo Santo, fato inusitado em qualquer outro momento das histórias das enchentes do rio. O que estará acontecendo? Porque nada foi feito de forma preventiva?
Ouvi relatos sobre a transformação de antigos paredões de pedra do Jirau, cobertos de petroglifos, pinturas rupestres e outras manifestações artísticas e culturais de sociedades indígenas ancestrais sendo transformados em brita para o avanço das barragens daquela UHE. Custei a achar que tal fato poderia ser sequer pensado. Hoje penso de outra forma.
Ainda vale a pena retornar ao tema do “CASARÃO DOS INGLESES” ou Casarão de Santo Antônio, que se encontra ameaçado e que o MPF me interpelou para saber de sua importância histórica, uma vez que, segundo o próprio MPF, o IPHAN declarou que o mesmo edifício não teria relevância histórica alguma. Aí a questão? O que é ter importância histórica? O sítio da antiga cidade de Santo Antônio é protegido e tombado pela Constituição do Estado de Rondônia e o casarão se encontra nele. Por lei, mesmo que o edifício não seja tombado, a paisagem local não pode ser alterada. Mais, será que a última construção civil daquela que foi a primeira cidade do Território federal do Guaporé não tem relevância histórica? Será que as memórias de tantos fatos sociais, culturais, políticos e históricos ali passados não asseguram sua relevância? Com a palavra o IPHAN.........
A pergunta é: com base em que este órgão e seu superintendente afirmaram isso? A ferrugem deixará de corroer as estruturas? O leito do rio onde a ponte está assentada não irá desbarrancar? O assoreamento não comprometerá suas estruturas?Porque então a ponte da rodovia foi reforçada para suportar as enchentes? Por outro lado as fotos sobre os desmoronamentos dos barrancos nas áreas dos mirantes deixam claro que o flagelo provocado pelos banzeiros vai destruir patrimônios naturais da comunidade de Porto Velho. Enfim, tive ontem a triste notícia de que um funcionário do Arquivo Histórico do Centro de Documentação da SECEL/RO, estava recortando jornais de uma coleção que deveria estar protegida, guardada e preservada. Alegando estar preservando notícias sobre o bairro do Roque, esse mesmo funcionário, a mando de seu superior destruía parte da memória impressa de nosso passado como sociedade. Descaso? Incompetência dos dirigentes do órgão? Negligência ou má fé e crime contra o patrimônio? Acho que temos aí um pouco de tudo.
E por aí vai. Hoje temos funcionando um Curso de Arqueologia na UNIR, formamos uma turma de especialistas em Arqueologia na FSL e a prefeitura consegue obter todas as licenças para obras no igarapé Santa Bárbara, berço da cidade de Porto Velho, sem realizar um único e mero diagnóstico arqueológico da área de enorme relevância para a memória da capital. E o que pensar de todas as outras obras, loteamentos, estradas, portos, pontes, etc. A lei é clara. O laudo arqueológico é tão importante como os laudos ambientais. Onde ficam as autoridades responsáveis pelo assunto? O que elas têm a dizer sobre isso tudo?
Pensando nisso e em muitas outras coisas os Departamentos de História e Arqueologia da UNIR fizeram hoje uma reunião em comum. O tema não poderia ser outro. Pauta única, o patrimônio histórico, cultural e arqueológico de Porto Velho e de Rondônia e os estado de descaso e abandono por que este mesmo patrimônio tem passado. A situação de total descaso e abandono em que se encontram nossas edificações, patrimônios naturais e tantos outros.
Assim, o grupo presente propôs a criação de uma força de trabalho, um grupo de estudos e pesquisas sobre a questão e a abertura de canais de diálogos com a sociedade que tem assistido a tudo, escandalizada, mas que, desagregada, pouco pode fazer. Estamos, então, criando o GRUPO DE ESTUDOS E PESQUISAS INTERDISCIPLINARES SOBRE O PATRIMÔNIO HISTÓRICO, CULTURAL E ARQUEOLÓGICO DE RONDÔNIA.
Este Grupo deverá propor ações sociais, via mídia eletrônica, redes sociais, imprensa em geral na tentativa de estabelecer o debate, a vigilância e a preservação de nossos bens patrimoniais. Queremos poder aplaudir nossas autoridades, empreendedores e outros pelo bem que possam vir a fazer ao nosso patrimônio, à nossa memória social comum e na preservação de nossa identidade como povo. Enquanto isso não for possível, como no atual momento, iremos trabalhar para esclarecer a sociedade, reuni-la em torno de causas comuns e lançar o debate e a luta civil organizada, legal e legítima em defesa de nosso acervo patrimonial.
Estamos trabalhando para o lançamento de um BLOG sobre o tema do Patrimônio Histórico, Cultural e Arqueológico. Da mesma forma os Departamentos de História e Arqueologia irão criar uma página no site da UNIR para tratar oficialmente do tema. Dessa forma a Academia irá tomar posição, oferecer seu parecer embasado no conhecimento cientifico e acadêmico e assim, estimular a sociedade nessa caminhada rumo ao respeito aos bens patrimoniais e á preservação de nossa memória coletiva como um povo, um estado e um município.
Não suportamos mais ver nossa memória e bens patrimoniais tratados com tamanho descaso e descuido. A hora é agora devemos, todos nós, somar esforços para preservar o que restou de nosso patrimônio. Junte-se a nós você também. Todo apoio, contribuição e iniciativa nesse sentido será bem vinda.
Autor: Marcos Domingues Teixeira
Doutor em História
UNIR

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